segunda-feira, dezembro 06, 2010

Poço sem fundo - um Biografema

Sangue. Foi da dor que eu nasci. Não apenas da minha mãe. Da dor da minha mãe. Da minha dor. Um machucado na testa aos 3 anos de idade. Também foi dali que meu pai nasceu para mim, com seu primeiro cuidado da filha machucada.

Havia um menino mamando nos seios de minha mãe... e ele era meu irmão! Doeu também... Mas a dor sempre passa... Ao menos, têm passado.

Dores do passado, dores que tenho passado, dores que passaram.

Tenho nascido, e aprendido! com as dores.

Dançando e cantando. Há a alegria! A arte! A liberdade! Ainda menina, bem cedo, já era o que me encantava, me embalava. Era menina. Era a própria alegria. Da inocência que dança, da pureza que canta. Dançava, rodopiava, piava, cantarolava, para ninguém... para mim! para a vida!

Mudanças. Cidades. Muitas caixas. Caixas de lembranças que ficaram para trás. De amigos, de escolas, de casas. Caixas do nunca mais. Caixinhas dentro de outras caixas dos meus eus encaixotados. Caixas extraviadas. Caixas arregaçadas. Quanto peso para carregar na memória, quanta perda para suportar o coração. Quanto alívio o voo, a fuga!

Mudanças – do eterno devir – andanças.

A letra. O desenho. As leituras: começo de uma grande aventura.

Imagem, imaginação, viagem. O nascimento de um novo mundo, e este, do amor entre eu e o mundo. E então as cores, as formas, as palavras. Ah! quantas profundezas que saem do papel – poço sem fundo. Vi minha vaga imagem como num reflexo dentro do poço – e esta, também era sem fundo. Sem fundo e sem fundamentos. Carregava por vezes tormentos... Mas era bela, porque também era o Mundo!

Bebo e vivo da água deste poço, que gota a gota, inesgota minha insaciável sede de ser.

Foi do sexo entre o nascimento, a dor, a dança, o canto, a mudança, a letra e a leitura que pari a filosofia. E Desta, a poesia. Não haveria como dizer o indizível. Mas houve como cantá-lo. Como desenha-lo. Como esboça-lo, borrá-lo, esculpi-lo, inventá-lo. Não houve como pega-lo. Mas houve como sussurrá-lo.

2 comentários:

sorsandro disse...

Ao nietzscheano pensador

Vossa seiva anárquica é como energy drink e/ou arte cult liberrtária,
justamente por que o tensionamento
perfaz o atuar elucidativo plugado na estética da condescendência
que é sedutora e provocativa da libido e/ou amor pelo conhecer...
pelo entendimento...
pela sabedoria fluída através de ato de pensamento.


ps. o eterno devir do pensador são as eternas dores do mundo?

Danielle Antunes disse...

Grata pela degustação das escrituras! Também pelos comentários apreciativos!

Esta é uma ótima pergunta! Me fez pensar bastante... porque o eterno devir do pensador parece provir das dores eternas sim, mas também dos sonhos, prazeres, alegrias, medos.. é um devir do existir seja como for, e que venha como for.. e caminhando em sendas platonicas, prazer e dor são inseparáveis, bem como o apolíneo e o dionisíaco que faz brotar a arte.

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